Como eu disse em “Sobre mim”, criei esse blog para trocar ideias sobre como andam os relacionamentos amorosos hoje em dia. Começo agora uma sequência de posts sobre minhas pesquisas sobre o amor. Diferente de um post comum, estes não terão propriamente um fim. São to be continued. Para que possam ser transformados em um livro, conforme meu desejo expresso quando criei esse blog.
[21/04/2013 03:43:35] M: Cadê você? Não vai mais falar comigo? O Almodóvar mandou você falar comigo – ele disse bem alto, prá todo mundo ouvir: Hable com ella (Fale com ela).
[21/04/2013 04:01:55] M: e aí, vai hablar? Quanto tempo vou ficar plantada aqui na frente dessa tela esperando a canetinha [do Skype] começar a andar? Que foi? Acabou a tinta? Você sabe que quando me dá na louca apago tudo antes de você ver. Aí já conhece o texto né?: “esta mensagem foi removida”. Não adianta reclamar.
[21/04/2013 04:07:35] M: tudo bem, príncipe encantado, enquanto você não desencanta e já que hoje eu tô com uma paciência beneditina, vou continuar aquela conversa. No caso, o meu monólogo. Afinal, você sempre diz que adora ler o que escrevo e fica me perguntando do meu livro sobre o amor, querendo saber como andam minhas pesquisas sobre esse assunto.
[21/04/2013 04:11:36] M: Então, voltando à vaca fria: uma das inúmeras coisas que li sobre o Fale com Ela [o filme do Almodóvar] foi uma psicanalista dizendo que tudo que uma mulher quer é aquilo que Alicia tem – um homem dedicado a ela full time. E que tudo que um homem quer de uma mulher é aquilo que eles – os dois – tem: duas mulheres disponíveis para seu domínio. Em se tratando de psicanalista você sabe que a mãe sempre tá presente né? Não vem ao caso agora se a psicanalista tem ou não razão – ou qual seria a razão dela. E se eu usar isso no livro vou contar quem é a Alicia e outros personagens desse filme do Almodóvar. Agora quero falar do que o filme tem a ver com a gente. Do amor.
[21/04/2013 04:18:52] M: Em algum momento atrás – e já nem sei se foi hoje te escrevendo aqui mesmo no Skype (você me deixa falando sozinha e dá nisso: acabo me perdendo, sem saber se só pensei ou se já falei) – comecei a te contar e não terminei: resolvi encarar o artigo prá pensar sobre o amor hoje, nas relações contemporâneas. Tipo: não dá prá aguentar viver o que vivo sem escrever sobre.
[21/04/2013 04:23:09] M: Lembra daquele sociólogo polonês que comentei com você outro dia, que escreveu Amor líquido? Ele diz que em vez do amor sólido, feito para durar, o que caracterizaria nosso jeito de amar seria o “amor líquido”, que escorre entre os dedos. A ideia quase me seduz porque dá a ideia de que o amor é um sentimento que muda com a história. Parece que ele está concordando que hoje nós amamos de um modo diferente do que em outros tempos; particularmente, está dizendo que pulamos de galho em galho em vez de nos fixarmos num relacionamento único e duradouro – eterno (?). E também que esperamos coisas diferentes do amor. Pelo menos ele parece embarcar nessa – mas não é bem assim. Porque ele lamenta essa mudança. Entendeu? Se o amor é histórico, então ele é um sentimento ou uma forma de se relacionar que muda conforme a época. Mas aí vem ele dizendo que isso – esta mudança – não é o amor verdadeiro: é “amor líquido”. Durma-se com um barulho desses.
[21/04/2013 04:33:09] M: Ele – o nome dele é Bauman – vê essa liquidez do amor como resultado dos nossos medos, da nossa malemolência: diante do primeiro conflito nós pegamos a tesoura e saímos cortando os vínculos. Por qualquer coisa já entornamos o copo e com isso, como a batatinha quando nasce, o amor também se esparrama pelo chão. Para ele ninguém mais quer manter relacionamento de longo prazo, “sério e duradouro”. É como se a gente tivesse que estar todo o tempo atualizando o aplicativo, fazendo download e upgrade. Para ele uma coisa é o “amor verdadeiro”, o amor que dura, e outra seria o “amor líquido”, descartável. E critica que nós confundimos tudo, chamando noites de sexo casual como “fazer amor”. Sabe o que me incomoda? Como tenho estudado o assunto – o amor – essa exigência que nós fazemos ao amor, de que seja eterno, faz parte do que os historiadores chamam de “amor romântico” e que culminou num determinado período do Ocidente (séculos XVIII e XIX), estendendo-se até hoje. Poucos notam a distância entre essa ideia de amor e aquela outra, cantada no “Soneto de Fidelidade” do Vinícius (de Moraes):
[Que] Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
[21/04/2013 04:45:09] M: Pelo que entendi do Bauman, o modelo ou a expressão mais bem acabada do “amor líquido” seria o amor virtual. E a vantagem principal do namoro pela internet é que nesse mundo virtual você pode terminar quando quiser. Virar a página sem dó nem piedade. Basta um enter – no deletar ou no bloquear – e the end. O que é bem prático mesmo se a gente não for saudosista. Você sabe por que esse namoro virtual funciona, segundo ele? Porque não exige aquela disponibilidade que falei aqui no começo; nada do compromisso, da obrigação de estar à disposição do outro quando ele precisa. Você só tem que estar online – e isso você também escolhe sozinho. Não precisa que o outro concorde.
[21/04/2013 07:01:10 PM] M: Aliás, não é exatamente isso o que está acontecendo agora com a gente? Você fica aí “verdinho”, online o dia inteiro no Skype e eu aqui falando sozinha dias, semanas, meses. É um monólogo? Não sei. Porque nós dois sabemos quantas vezes você está aí do outro lado lendo enquanto escrevo até se trair numa gargalhada deliciosa que você não consegue mais segurar; aí, lá vai a canetinha começar a andar, nem que seja prá escrever “kkkkkkkkk” ou “ahahahahaah”. Sem falar das vezes em que me surpreende com um longo telefonema prá gente continuar o papo.
[21/04/2013 07:03:13 PM] M: Se o “infinito enquanto dure” não combina com o badaladérrimo “amor líquido”, “tô nem aí”. Quer saber? Prefiro que o poeta me guie.
[28/04/2013 16:52:08] M: cadê você? Cansei, tchau, depois continuo. Um beijo.
To be continued…
Minha querida amiga, no momento estou com raiva de você. Não me basta fazer um comentário. .. Fiquei com muita vontade de estar ao seu lado agora mesmo , e conversar muuuuito ! Você tem o dom de escrever sobre o que eu nem estava com vontade de ler, mas depois de fazê -lo só quero falar sobre isso, e com você. Ainda bem que nossa amizade é sólida, mas mesmo assim , ainda estou com raiva!
ahahahaah Maria Célia, saudade – é só o que consigo dizer quando te leio. Logo viro parnasiana e fico com vontade de dizer que você viceja minha vida… Adorei deixá-la com raiva também. A causa é boa. Continua comigo. Um beijo.
Marcia, querida! Usar um filósofo contemporâneo para refletir sobre a vida, faz toda a diferença. Entre o “eterno enquanto dure” e o “amor líquido” precisamos rastrear nossa mania de idealizar o amor que, finalmente, vem sendo colocada em xeque! Lembra de Mulheres apaixonadas, de D.H.Lawrence? Acho que estavam mais próximas de nós do que pensávamos. Quero ver como a história continua… acredito sempre mais nos poetas. bjs
Madé, querida! Exato, Mulheres Apaixonadas do Lawrence – e algum Tolstói sobre o qual ainda não tivemos tempo de conversar nessa nossa comunicação virtual (mas de quem falamos bastante em nossas conversas no departamento) – surpreendemente mais próximas da gente do que poderíamos imaginar mesmo. Bom você vir comigo nessa história – entro na maior abstinência quando não consigo escrever, como você já sabe né? Ando ensaiando passear pela Virgínia Woolf, pela Yourcenar e por aí… Vou te falar prá gente combinar nossa próxima leitura a duo. Um beijo.
(Hahahaha… precisei rir de Maria Célia agora.)
Bem, há tempos não falo sobre o amor. Encalhei no assunto maternidade. Pensando bem, pode até ser um bom momento pra retomar o assunto. Coincidentemente falamos aqui em casa hoje sobre o tema. Deve ser um sinal! Não há coincidências.
Aguardando o próximo já. :*
Eu também, Luciana, sempre tô rindo dessa minha Maria Célia querida! Ela espalha sagacidade e humor fino, rápido, inteligente que ajuda a melhorar nossas vidas. Quanto à maternidade onde você encalhou eu posso entender muito bem e fiquei aqui pensando no “sinal” e nessa sua frase: “Não há coincidÊncias”. Vamos ao próximo, já já. Beijo, querida. Gosto muito da sua companhia.
Querida Márcia! Você escolheu uma abordagem diferente, criativa e moderna para tratar de um tema tão complexo: o Amor! Não sou escritora, poetisa e muito menos especialista no assunto, mas ouso afirmar que, na minha singela visão, “amor líquido” não pode ser chamado de amor. Faz 21 anos que comecei a namorar o meu marido e estamos casados há 12 anos. Significa dizer que estou com ele mais da metade das nossas vidas. Já passamos por situações de diversas naturezas e, não obstante, permanecemos juntos. Há 21 anos não vislumbro minha vida sem ele. É bem verdade que esse cenário pode mudar, pois apesar do livre arbítrio, desconhecemos o futuro. De qualquer forma, por tudo que já vivemos, posso dizer que nosso amor é infinito e eu espero e acredito que ele dure… Ao contrário do que possa parecer, não sou romântica, mas como chamar de amor, aquilo que é “líquido”? Grande beijo para vc!
Pois é, Michelle querida, tô tentando desamarrar esse nó… Um beijo (você pode se inscrever no blog e recebe as notificações no seu e-mail a cada novo post!).
Sou contemporâneo, mas não me casei pra viver um “Amor Líquido” e também não viver uma “chama” como diz o poetinha. Espero que eu continue sendo um eterno romântico e meu relacionamento siga na mesma linha.
Mas é verdade que hoje em dia não queremos dificuldades e nem barreiras com coisa alguma e um relacionamento é, de fato, cheio desses componentes. É verdade que “bloquear” é mais fácil, mas o complicado foi o que sempre me impulsionou.
Muito bom o post, Márcia. Gostei do formato inovador.
Até a próxima.
Sensacional. Adorei a “pegada”.
Que bom que gostou! E que a pegada colou… porque vou seguir. E pelo visto, bem acompanhada. E como tenho perguntado aqui: você já se inscreveu prá receber as notificações de novos posts? Beijo.
Puxa, já é bom saber que você notou o novo formato, melhor ainda saber que é inovador! E vou seguir nele… funcionou bem né? Beijo.
Marcia… Li, pensei, pensei, pensei e não consigo escrever um comentário que preste! Ainda não tenho maturidade pra ler seus posts sem me projetar… Adorei, obviamente, mas continuarei lendo pra que possa começar a comentar algo menos pessoal. Kkkkkkkkkk
Ademais, muito interessante essa teoria de amor líquido. Se encaixa perfeitamente no que vemos nos relacionamentos atuais. E fiquei curiosa, quero assistir esse filme do Almodóvar. Um beijo.
Laís,como assim sem se projetar?! Lutando prá “comentar algo menos pessoal”??? Não, por favor, não recuse suas experiências pois elas são a matéria prima prá saborosas reflexões – talvez eu até me atrevesse a dizer que são as melhores. Lembra do que eu fiz em “Os filhos da mãe”? Já o primeiro capítulo não se chama “Escreva sobre sua própria experiência”? Go ahead e manda ver: é de você, sobre você, sobre “sua” leitura mesmo que podemos conversar gostoso. Das discussões teóricas que tentam atropelar essa experiência subjetiva eu tenho fugido cada vez mais. Beijo (já se inscreveu no blog?).
Marcia, leio e assisto tudo seu. Deferência por ser minha conterrânea, filha de amigos da família? Não, por admiração a seu trabalho mesmo. Li ” Déspotas Mirins”, amei, embora não tenha criado filhos assim, porque fui ” mãe bruxa”, li os ” Filhos da Mãe” sentindo- me, na primeira cadeira da classe, sugando tudo. Razão? Fui, nos primeiros anos da maternidade, mãe aluna, aquela que procura o melhor lugar para deixar o filho e voa para a UNB, depois mãe profissional e fui levando, em minha bagagem, culpas camufladas, não assumidas. Resultado? Três filhos muito bem estruturados, bem posicionados. Então, você me perguntará:”- Culpa de quê”? Assim como fui ” mãe bruxa”, eles tiveram seus momentos de ” filhos carrascos, revoltados sem causa”. Após minha viuvez, há 19 anos e filhos, recém ” aniversariados, 24,20,18 e perdendo um super pai e eu um tremendo marido, companheiro…As dores foram imensas e dei só a eles, por um longo tempo, o direito de sofrer, pois na minha cabeça torta, já tinha sido ” mãe qualidade e não quantidade”, por tempo demais. Os anos se passaram, vieram Mestrado, Doutorado, londrinos ou brasileiros e a mãe culpada trabalhando, aumentando sua bagagem invisível. Diante da depressão de um dos filhos, 10 anos após minha viuvez, o deprimido tomado pela doença e liberdade provocada por ela, começa a apontar algumas falhas desta mãe aqui e os outros fizeram couro. Aquele dia, senti meu mundo ruir, o total fracasso como mãe e como se eu tivesse achado meus pais perfeitos e pudesse esquecer 10 anos de internato, não eles não foram, mas eu, em minha concepção torta, tinha de ser, logo a bagagem foi aberta e tudo se espalhou. Foram meses catando os itens dessa bagagem e muita terapia, até um dia que dei um basta, chamei todos para uma ” reunião de família, reunião de classe filial.” Foi um tremendo susto por que a ” mãe bruxa” estevivera ausente por muito tempo, dando lugar à ” mãe fracassada.” Sei que o resultado foi melhor do que eu esperava e, depois dos ” Filhos da Mãe”, quando meus ouvidos de hansiano ouvem algo, que cheire a cobrança, mando ler os ” Filhos da Mãe”, comprei três e dei um para cada um. Então, Marcia, eu com 65 anos, filhos criados, netos,formada, aposentada, viajante por escolha. Aplaudo- a e lhe digo que o seu livro me ajudou muito, ele me fez jogar fora todos os itens da bagagem de uma vida..Comprei um quarto livro, que passeia pelas mãos das minhas ” sobrinhas tortas”, que estão iniciando ou no meio dessa jornada maternal. Beijos, minha querida.
Zezé,
Que comentário denso, profundo, complexo, emocionante! Nem sei o que dizer – ainda. Exceto que me servirá muito prá garimpar temas para minhas próximas reflexões. Obrigada, querida. Continue me dando o prazer imenso de estarmos juntas. Um beijo.
Não há o que agradecer, Marcia, você é muito capaz e está trilhando muito bem o caminho que escolheu. Parabenizo- a mesmo. O que precisar, ou quiser em BSB, conte comigo, mesmo estando viajando, que é ” meu estado civil atual”, encontrarei uma maneira de atendê- la. Beijos❤️
O pseudo-amor e o amor romântico (entre dois e “sequissual”) me estiolam os neurônios como se fosse a própria Esfinge.
Só sei que nada sei.
E que o saber é etimologicamente “saborear”.
E que o amor é essência da vida para ser saboreada.
Verdadeira pulsão de vida e chave de grandes mistérios.
O que é o pseudo-amor? E o ”sequissual” fica entre ele e o romântico? Vc tá chamando de “romântico” aquele tal de “platônico”? Como vc vê, sua amiga aqui é uma aliada da Esfinge estiolando seus neurônios com suas perguntas intermináveis. Imagine o meu inferno interno, dentro dele essa devoradora só não me consome porque vivo/escrevo dos enigmas que ela me coloca.
Amor e batatinha. Eu sempre imaginava a coitada da batata sendo esmagada por um caminhão quando ouvia a história. Entendi que por uma rima esmagam-se batatas, vidas e … amores. Mas, pergunto: uma rima deixa de rimar? O escutar é que muda? Ou está o amor, desde o nascedouro, fadado a ser esmagado, rimando ou não.